sexta-feira, 18 de abril de 2008

Sonho repetido

Durante muitos anos eu tive o mesmo sonho que acontecia sempre da mesma maneira. E depois dele eu sempre acordava com a impressão de que ele era mais real que meu quarto e as coisas que estavam a meu redor. Eu ficava tão atordoada que demorava a perceber que era apenas um sonho, de tão real que era.

Nesse sonho eu estava com roupas antigas, vestidos que iam até o chão e tomava conta de 4 crianças. Elas corriam ao meu redor e quando eu ia tirar água de um poço elas corriam e entravam em um barracão de madeira e subiam por uma escada que lá havia.

Minha reação era de desespero, eu jogava o balde de água no chão e corria atrás delas, chamando-as num idioma que se parecia com holandês. Eu subia a escada atrás delas e entrava num aposento. A princípio não se via nada pois estava em quase total escuridão. Aos poucos eu via uma criança de dentes pontiagudos e desiguais cujo sorriso mais parecia uma careta de dor. Ela estava amarrada a uma cama de madeira que se parecia a um tablado e as janelas do aposento estavam fechadas e lacradas com pedaços de madeira. Um pequeno lampião estava ao lado da cama, única fonte de luz do lugar.

Eu parava ao lado das crianças, aterrorizada, e elas após um primeiro momento de indecisão aproximavam-se da cama, estranhando a figura tão grotesta. Meu coração batia descompassado e eu tratava de reunir as crianças para tirá-las de lá, mas elas começavam a correr ao redor da cama para fugir de mim, numa brincadeira comum de crianças. A criatura amarrada à cama parecia divertir-se com aquilo e soltava risos que demonstravam seu retardo mental.

Aproximando-me percebi que as correias entravam em sua carne, deixando muitas marcas em vários estágios de cicatrização. Também senti um cheiro horrível de excrementos, a criança deveria fazer suas necessidades na própria cama e ninguém se encarregava de limpá-los. Fugi dali, enojada, finalmente arrastando as crianças comigo à custa de brados e ameaças.

Porém ao sair do quarto uma delas esbarrou no lampião próximo à cama da criança e logo as chamas começaram a se esparramar pelo quarto. Fugi com meus pupilos escada abaixo, abandonando a criatura à própria sorte. Já no final da escada ouvia seus gritos (mais parecidos a urros de animal), e deduzi que as chamas já haviam chegado à sua cama.

Já ia saindo do barracão quando me dei conta de que aquela criatura, mesmo apresentando a forma que mais se assemelhava à de um animal, ainda assim era um ser humano e sobretudo era uma criança e portanto eu não poderia permitir que morresse abandonada à sua sorte.

Subi novamente as escadas pulando os degraus de dois em dois, mas quando abri a porta do quarto já as chamas e a fumaça o haviam tomado totalmente, não se via nem a criança nem nada mais, o fogo já tomara completamente o aposento.

Nesse ponto eu sempre acordava desesperada e mesmo depois de bem acordada ainda podia sentir o calor do fogo e o cheiro da fumaça por algum tempo, chegava a abrir a janela para que o ar fresco varressem essa sensação.

Tive esse sonho durante anos e anos a fio, dos 13 anos (logo que comecei a desejar um dia adotar um filho) até a noite anterior à chegada do Alan em casa. O fato de eu ter 4 crianças comigo também é sugestivo porque além do Alan eu tenho outros 4 filhos, que não foram adotados.

(zailda mendes)

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